Bancos alegam divida de 200
bilhões aos poupadores, mas devem, no máximo, 37,9 bilhões, conforme estudo da
Procuradoria Geral da Republica
Enquanto a economia brasileira e os poupadores
tiveram prejuízos nos planos econômicos – Bresser (1987), Verão (1989), Collor
I (1990) e Collor II (1991) –, os bancos obtiveram lucros inimagináveis,
chegando, segundo estudos, a mais de 400 bilhões somente com o lucro obtido com
a aplicação, no mercado financeiro, dos recursos expurgados aos poupadores.
Porém, para não pagarem aos poupadores pelos expurgos inflacionários, os bancos
alegam que devem mais de R$ 200 bilhões e que pagar esta dívida colocaria em
risco o sistema financeiro nacional.
Os bancos, por meio da
Consif (Confederação do Sistema Financeiro) foram ao STF, no início de 2009,
alegando que os poupadores não tem direito adquirido. Esta iniciativa resultou
na ADPF (Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 165. O relator,
Ministro Ricardo Lewandowski, negou a liminar requerida pelos bancos, que
alegavam riscos a todo o sistema bancário em virtude do tamanho da dívida,
calculada por eles em mais de R$ 200 bilhões.
Este mesmo número serviu, também, em 2010, só
que desta vez no STJ (Superior Tribunal de Justiça), quando os bancos foram além:
argumentaram que a divida para com os poupadores é de 208 bilhões, porém para apenas
dois dos quatro planos, Bresser e Verão. Só que desta vez ganharam ao obter, no
Recurso Especial 1070896/SC, em que o Réu é o Banco do Brasil, o fim de
centenas de ações civis publicas que tramitavam no país requerendo estas
diferenças. A vitória veio com a decretação da prescrição de todas elas, isto é,
diminuindo-se o prazo de ajuizamento destas de 20 para 5 anos, o que levou às
suas extinções. Em seu relatório o Ministro Luiz Felipe Salomão utilizou o
argumento econômico dos bancos como principal razão de decidir em favor deles e
contra os poupadores.
Ocorre que estes números, nunca explicados pelos
bancos, não batem com estudos recentes a respeito. Para o Plano Verão, por
exemplo, se todos os poupadores prejudicados recebessem de todos os bancos,
inclusive daqueles já extintos, a dívida seria de no máximo R$ 29 bilhões. Este
é o numero apresentado pelo ex-economista chefe da FEBRABAN e professor da USP
Roberto Luis Troster em estudo a respeito do impacto do Plano Verão, no qual se
serve dos dados divulgados pelos próprios bancos desde então.
Alem de desmentir a FEBRABAN quanto ao tamanho
da dívida, o estudo de Troster revela que os bancos lucraram, ao aplicarem os
recursos que confiscaram dos poupadores no Plano Verão, mais de R$ 200 bilhões.
Para chegar a este número Troster se serve apenas dos rendimentos acumulados
desde a edição deste plano pelo CDI (Certificado de Depósitos Interbancários),
normalmente utilizado pelo sistema financeiro. De acordo com o estudo, o CDI
rendeu, no período, 7,8 vezes mais do que a poupança. Ou seja: os 29 bilhões
devidos aos poupadores, corrigidos pelo CDI, viraram R$ 230 bilhões. Com isto,
ainda que fossem pagos todos os poupadores lesados neste plano, o lucro seria
de R$ 201 bilhões.
Entendimento muito parecido consta, também, de
profundo estudo econômico a respeito dos impactos dos planos da Procuradoria
Geral da República. O estudo foi encomendado pela PGR para contestar os números
dos bancos e constou do parecer que apresentou na ADPF 165.
De acordo com a PGR, se todos os poupadores
recebessem de todos os bancos os expurgos inflacionários de todos os planos, a dívida
seria de R$ 37,9 bilhões, pelo menos 5 vezes menor que a apresentada pelos
bancos para apenas dois planos. Este número é um pouco maior do que o lucro líquido
obtido no ano passado por apenas quatro bancos brasileiros (Santander, Itaú,
Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal), divulgado como sendo superior a R$
30 bilhões. Ou seja: os lucros somente destes bancos, em um único ano, pagariam
praticamente toda a dívida dos quatro planos a todos os poupadores.
Os técnicos da PGR analisaram, também, os lucros
que os bancos tiveram ao aplicarem os recursos dos poupadores. Se servindo de
uma cesta de índices que espelham a média de rendimentos dos bancos, a PGR concluiu
que lucraram R$ 441,7 bilhões, quase 12 vezes a dívida com todos os poupadores
para todos os planos. Descontando os R$ 37,9 bilhões que devem aos poupadores, caso
pagassem integralmente a dívida, ainda lhes sobrariam R$ 404 bilhões.
Ao negar as liminares
requeridas pelos bancos no STF, o Ministro Lewandowski, além dos argumentos
jurídicos, se serviu destes estudos e os cita em seu relatório. Já no STJ o
ministro Salomão, ao decidir em favor dos bancos, se serve apenas da versão da
FEBRABAN, sem citar qualquer fonte ou estudos que comprovem estes números.
Dívida
ainda menor
Embora os dados apresentados nestes estudos, por
si só, sejam suficientes para desmontar a estratégia dos bancos de impor a
ameaça de quebra do sistema financeiro para não pagar, insistentemente apresentada
ao judiciário, o que os bancos terão efetivamente que pagar e muito menos. Há várias
razões para isto e um deles é que a maioria dos bancos, em especial os
públicos, já devolveu grande parte do que deve aos poupadores, não apresentando,
assim, necessidade de contabilizar novos recursos e não causando, portanto, nenhum
rombo financeiro.
Esta é a opinião do advogado Alexandre
Gonçalves, assessor jurídico do IPDC (Instituto de Proteção e Defesa do
Consumidor do Brasil. Ele diz, ainda, que diversas outras razões objetivas e
consolidadas que fazem esta dívida ser muito menor, especialmente no Paraná,
estado em que os bancos, destacando-se o Itaú, buscam na justiça decisão que
anule seus ganhos judiciais. Confira porque, na opinião de Gonçalves, os bancos
estão mentindo:
1 – Muitos bancos já pagaram a dívida aos poupadores,
especialmente a Caixa Econômica Federal, que no país todo fez acordos com os
poupadores e já os pagou, e no Paraná em específico já pagou a praticamente
todos os poupadores que executaram a Ação Civil Pública da Apadeco (Associação
Paranaense de Defesa do Consumidor). Ou seja: quanto à CEF praticamente não há
rombo.
2 – No caso do Banco do Brasil, este também já
pagou a praticamente todos os poupadores do Paraná, restando, quando muito,
fração não superior a 20% dos poupadores que ainda demandam em Juízo. Logo,
para o Banco do Brasil praticamente não há prejuízo, visto que tem poucos
poupadores a pagar ainda.
3 – Mesmo nas execuções em curso no Paraná, por
exemplo, praticamente 100% dos valores em discussão já se encontram depositados
em Juízo para, no mínimo, garantia da execução. Ou seja: estes recursos não
estão mais nos cofres do banco, mas sim já depositados em juízo e contabilizados
como direcionados aos pagamentos dos poupadores. Isto quer dizer que não estão
sendo afetados por este dinheiro, não mais figurando em suas contabilizações
correntes para operações bancarias que gerariam lucros.
4 – Com a extinção de centenas – fala-se em mais
de mil – de ações civis públicas buscando estes expurgos graças ao novo prazo
prescricional de 5 anos, decidido no RESP 1070896/SC (a decisão ainda não é
definitiva porque enfrenta recurso da Procuradoria Geral da República, que quer
levar a discussão ao STF), a dívida dos bancos caiu gigantescamente.
5 – Por fim, há outro dado importantíssimo: uma
grande parte do que os bancos acreditam que terão que pagar encontra-se
provisionada em seus balanços e informada ao Banco Central. Este é mais um dado
que corrobora que não quebrarão.
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